quinta-feira, 4 de agosto de 2016

O conjunto não enumerável dos numeros Reais

Um fato bastante importante sobre o conjunto $\mathbb{R}$ dos números reais, que eu quando imaturo ignorava, é a propriedade de que os números reais são não-enumeráveis. Falando de modo simples, a enumerabilidade de um conjunto define se ele pode ou não ser contado, é natural que conjuntos finitos são conjuntos enumeráveis. Os casos mais interessantes são conjuntos infinitos, por exemplo, o conjunto $\mathbb{N}$ dos números naturais e o conjunto $\mathbb{Z}$ dos números inteiros são conjunto enumeráveis. 

Definição 1. Um conjunto $X$ é dito enumerável quando é finito ou quando existe uma bijeção $f:\mathbb{N}\rightarrow X$. 

Neste caso, $f$ chama-se uma enumeração dos elementos de $X$. Escrevendo $f(1)=x_{1}, f(2)=x_{2}, ..., f(n)=x_{n}, ...$ , temos $X=\{x_{1}, x_{2}, x_{2}, ..., x_{n}\}$.

Então, como nos exemplos citados anteriormente, obviamente podemos encontrar uma bijeção $f:\mathbb{N}\rightarrow\mathbb{N}$. Para os números inteiros podemos encontrar uma função bijetiva que faz corresponder números naturais impares aos inteiros positivos e números pares que faz corresponder à números inteiros negativos, ou seja, $f(0)=0, f(1)=1, f(2)=-1, f(3)=2, f(4)=-2,...$.

O conjunto $\mathbb{Q}$ dos números racionais também é enumerável, mas a demonstração desse fato tem conteúdo para outra postagem.

Um teorema que precisamos para mostrar que $\mathbb{R}$ é um conjunto não enumerável é o teorema dos intervalos encaixados, que afirma que dentro de toda sequencia decrescente de intervalos, por menor que seja, contida nos reais existe um numero $c\in\mathbb{R}$.

Teorema 2. (Intervalos encaixados.) Dada uma sequência decrescente $I_{1}\supset I_{2}\supset ... \supset I_{n}\supset ...$ de intervalos limitados e fechados $I_{n}=[a_{n},b_{n}]$, existe pelo menos um numero real $c$ tal que $c\in I_{n}$ para todo $n\in\mathbb{N}$.

Demonstração: As inclusões a cima nos dizem que $$a_{1}\leq a_{2}\leq...\leq a_{n}\leq ... \leq b_{n}\leq ... \leq b_{2}\leq b_{1}.$$ Tome $A={a_{1},...,a_{n},...}$.  Então $A$ é limitado superiormente. Seja $c=SupA$. Temos então que $a_{n}\leq c$ $\forall n\in\mathbb{N}$. Alem disso, temos que cada $b_{n}$ é cota superior de $A,$ logo $c\leq b_{n}$ $\forall n\in\mathbb{N}$. Portanto $c\in I_{n}$ para qualquer que seja $n\in\mathbb{N}$. $\Box$


Enfim, vamos mostrar que os números reais não é enumerável como um teorema.

Teorema 3. O conjunto dos números reais não é enumerável.
Demonstração: Para mostrar essa proposição basta encontrarmos uma função $f:\mathbb{N}\rightarrow\mathbb{R}$ que não não seja sobrejetiva, assim estaremos mostrando que essa função não pode ser bijetora. Seja uma função $f:\mathbb{N}\rightarrow\mathbb{R}$. Tome para $n=1$ um intervalo $[a_{1},b_{1}]\subset\mathbb{R}$ tal que $f(1)\notin[a_{1},b_{1}]$. Para $n=2$ um intervalo $[a_{2},b_{2}]\subset[a_{1},b_{1}]\subset\mathbb{R}$ tal que $f(2)\notin[a_{2},b_{2}]$. Fazendo isso sucessivamente, teremos para todo $n$ que $$f(n) \notin [a_{n},b_{n}]\subset ... \subset[a_{2},b_{2}]\subset[a_{1},b_{1}]\subset\mathbb{R}.$$ Agora, pelo teorema dos intervalos encaixados sabemos que existe um $c\in\mathbb{R}$ tal que $c\in [a_{n},b_{n}]$. Daí, não existe $f(n)=c$ para nenhum $n\in\mathbb{N}$. Logo, $f$ é sobrejetiva e portanto $\mathbb{R}$ é não-enumeravel.$\Box$

Entender essa demonstração é de fundamental importância para o estudante perceber uma de muitas maneiras de se encontra uma função desejada em certas condições além de trabalhar sua noção sobre funções. Escrever uma função $f:\mathbb{N}\rightarrow\mathbb{R}$ que ajude a analisar sua sobrejetividade não é trabalho fácil. Exige algum tempo para pensar nos passos para sua construção. E tempo pensando é o que mais ajuda na maturidade de um estudante de ciência.

Livros Recomendados
-LIMA, Elon Lages. Analise Real-vol 1,(12a Edição). Coleção Matemática Universitaria, IMPA, 2014.
-LIMA, Elon Lages. Curso de Analise, Volume 1 (decima primeira edicao).Projeto Euclides. IMPA, 2004.
-FIGUEIREDO, DG de. Análise I. SP. Editora GUANABARA, 1996.